quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Se Eu Cantasse (ou Aula de Canto)


Os fogos de artifício não me incomodam tanto. O estridente latido do cachorro do vizinho já não é incômodo algum. Carros de som fazendo propaganda na rua em pleno domingo de manhã. Música alta tocando em aniversário de criança quando quero conversar baixo. Em nada me atrapalham. Fúteis conversas animadas de senhoras sem ocupação, decidindo qual o melhor tecido pra se fazer uma passadeira nova, qual a cor que mais combina com a parede recém pintada em algum tom pastel e onde se comprar o material, quase não me incomodam. Nada se compara à minha voz desafinada quando tento cantar em sol maior ou mi menor. Enfim, em qualquer tom.

Não que eu queira ser um grande popstar de arrastar multidões, de encher ginásio esportivo e de levar garotas ao delírio. Essa pretensão eu nunca tive. Só queria mesmo cantar mais ou menos, no mínimo não desafinar tanto, não variar tanto as notas dentro de um simples dó sustenido. Até no banheiro, enquanto ensabôo meus cabelos, desafino tentando alcançar um ré qualquer, um misero rézinho sem importância alguma.

Deixa...deixa... Diriam-me aqueles que já nasceram sabendo cantar. Isso não é o mais importante. Claro que é. Lógico que é! Como não é o mais importante? Quando estou com ela isso é importante pra mim.

Acho que vou fazer aula de canto. Pra lhe sussurrar meus segredos, meus medos e desejos. Pra dizer minhas vontades ao seu ouvido, arrepiando os pêlos do pescoço. De ambos os pescoços. Enquanto ela tentasse dormir, de bruços ou de costas pra mim, cantaria baixinho nossas músicas preferidas, ainda que no meu inglês colegial ou no meu português comum. Atrapalharia nosso sono. Iniciaríamos nosso sonho. Terminaríamos sabe-se lá aonde. Se eu cantasse
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quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Bestialidades


Não se sentia bem pensando aquelas bestialidades, não era mais o mesmo. Nem seus ternos eram mais os mesmos. Tudo mudara: as cores das gravatas, os quadros nas paredes (as paredes), os tapetes na entrada e a entrada em si.

Contara-me um dia desses que nem mesmo o ar era capaz de entrar e encher-lhe os pulmões de vontade; que parecia ar boliviano, rarefeito; que não mais lhe preenchia euforicamente como fizera antigamente, e nem mais lhe trazia nostalgias, divagando em indesejados devaneios. De certo que por motivos e razões análogas às de outrora, mas com toques e pitadas de maturidade, de descontentamento e qualquer coisa que dê para disfarçar ao longo do dia apenas tornando-se ébrio.

Dissera-lhe que parasse de procurar culpa, culpados, dolo e dor. Tolice viver a apurar responsabilidades. Ainda que um dia já se orgulhara em ser tolo deveria ao menos não delirar-se com estapafúrdias e absurdas desculpas. Ora, elas viriam aos milhares, inundando-o de ausência de pensamento lógico acerca do plausível, do óbvio.

Não seriam culpados ou circunstâncias, ausências ou fugas, intenções ou apatia que lhe faria observar e compreender, se é que possível seja, o que lhe sucedera naqueles dias de naufrágio interior. Uma tempestade semi-tropical de inverdades, de desajustados sentimentos e de sentidos pouco aguçados.

Não havia nostalgia, não havia desejo de reviver a mal contada história que ocorrera. Nenhuma saudade, nenhuma dessas meiguices românticas, enervadoras. Não afirmava, tampouco desmentia, que não mais entregar-se-ia tolamente, loucamente. Generalizava tudo em um mesmo patamar de descontentamento, de desilusão, mesmo informado que não há nada mais besta que generalizações precipitadas.

Não se julgava precipitado como antes. Via-se sóbrio, não mais entorpecido por sentimentalidades inquietantes. Com esforço enorme arrancara de cenas confusas alguns fragmentos, alguns pedaços de contrariedade; arrancara montanhas de infelicidade.



sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Manchas de Sorvete e Bigode de Suco de Uva.


Quando ele chega trás consigo a alegria, o sorriso farto, oferecido e contagiante; trás consigo carinhos ingênuos, abraços apertados e beijos por todo meu rosto; trás comentários desconcertantes e perguntas embaraçantes;

Quando ele chega me leva a um outro mundo, esquenta meu coração e acalma minha alma. Somos dois solteirões eu pego carona na sua beleza, no seu carisma e na sua cara lavada. Elogios de tabela: ótimo.

Confere seu quarto, averiguando se todos os brinquedos estão por lá. Se todos os carrinhos estão estacionados no lugar que os deixou. Me explica todas as vezes que não pode subir na janela, porque é alto e perigoso e pode cair e machucar. Confere se o porta-retratos ainda está no móvel da sala e acha graça da sua foto com um embrulho de presente na cabeça (realmente é ótima essa foto).

Quando ele vai embora viro um pai sem manchas de sorvete no meu jeans; quando ele vai embora leva consigo o bigode de suco de uva; leva o sorriso fácil; a alegria.

Quando ele vai embora eu me lembro que os próximos dias serão de saudade. É fogo ser pai de fins de semana.


quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Texto?

Pois é, um dia poderemos ler uns textos aqui nesse blog, basta um pouco de paciência pra eu confeccioná-los.
Abraços.